Parnasianismo
Contexto sócio-histórico e características literárias
Escola poética de origem francesa, surgiu na década de 1850, opondo-se a alguns exageros românticos e ao que consideravam falta de cuidado estético do romantismo. Espelhando o espírito determinista de sua época, voltou-se à perfeição formal dos versos, às rimas ricas e à perspectiva da “arte-pela-arte”, ou seja, que a própria arte se explica por si mesma, não tendo compromisso algum para com a sociedade, a política ou o mundo.
No Brasil, apesar de ter tido o seu primeiro destaque nos momentos derradeiros do Império, o Parnasianismo (conhecido também como Ideia Nova) foi a escola poética oficial de parte da Primeira República (1889-1931). A Tríade Parnasiana, como era conhecido o grupo dos três principais poetas do movimento (Olavo Bilac, Raimundo Correia e Alberto de Oliveira), tornou-se o grande alicerce do parnasianismo, no país, embora outros bons poetas tenham se destacado fora da Capital federal (Rio de Janeiro), como Francisca Júlia (São Paulo) e Emílio de Menezes (Paraná).
Autores e obras
Olavo Bilac (1865-1918)
Considerado, em 1907, o “príncipe dos poetas brasileiros”, Olavo Bilac foi, sem dúvida alguma, o mais representativo dos parnasianos – não somente pela sua poesia, mas também por sua atuação pública e pela marca que deixou, longos anos após a sua morte. As suas Poesias (1888) demarcaram
o passo mais firme do Parnasianismo, no Brasil – e a série de poemas “Via-Láctea” acabou se tornando um clássico pelo tratamento da temática amorosa controlada, embora bela; musical, malgrado nas regras do soneto italiano, em decassílabos heroicos (quatorze versos e acentuação na
quarta e décima sílabas). Bilac, republicano e patriota, foi um dos árduos defensores do serviço militar obrigatório, além de ter sido o autor da letra do Hino à Bandeira. Para o poeta carioca, a pátria revelava-se pelo Idioma, ideal manifestado claramente num dos sonetos mais famosos de sua carreira, presente em Tarde (1919):
Língua Portuguesa
Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...
Amo-te assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!
Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
Em que da voz materna ouvi: “meu filho!”,
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!
Raimundo Correia (1859-1911)
Maranhense, foi um poeta com duas fases muito bem demarcadas (romântica e parnasiana) e uma que se aproxima do Simbolismo. Foi um parnasiano, por herança de sua primeira época, com forte carga emocional. Raimundo Correia foi um dos maiores poetas de nossa pátria. As suas temáticas variam entre a contemplação da natureza e a investigação filosófica, não raramente pessimista, do ser humano. Em suas Sinfonias (1883) estão os poemas mais essenciais de sua poética parnasiana, entre os quais “As Pombas” e “O Vinho de Hebe”. Dessa obra, eis um dos mais célebres sonetos do autor:
Mal Secreto
Se a cólera que espuma, a dor que mora
N’alma, e destrói cada ilusão que nasce,
Tudo o que punge, tudo o que devora
O coração no rosto se estampasse;
Se se pudesse o espírito que chora
Ver através da máscara da face,
Quanta gente, talvez, que inveja agora
Nos causa, então piedade nos causasse!
Quanta gente que ri, talvez, consigo
Guarda um atroz, recôndito inimigo,
Como invisível chaga cancerosa!
Quanta gente que ri, talvez existe,
Cuja única ventura consiste
Em parecer aos outros venturosa!
Alberto de Oliveira (1857-1937)
Considerado o mais radical dos parnasianos da tríade, Alberto de Oliveira, nascido em Saquarema (RJ), ainda tem a sua imagem ligada aos sonetos de descrição e de evocação à mitologia grega (como era típico do movimento), embora tenha atingido níveis muito mais elevados em sua poética. Participou de um momento decisivo para o Parnasianismo no Brasil, a chamada “Batalha do Parnaso”, ocorrida entre 1878 e 1881, nas páginas do Diário do Rio de Janeiro, cujo principal intento era mostrar que o Ultrarromantismo estava ultrapassado e jogar luz ao Romantismo original, indianista, em diálogo com as perspectivas poéticas dos novos tempos (influências do cubano José-Maria Heredia e do francês Leconte de Lisle, por exemplo). Em seus Sonetos e poemas (1886) é que a sua poesia se manifestou, porém, absolutamente parnasiana. Desse livro, eis um dos mais célebres sonetos:
Vaso Grego
Esta de áureos relevos, trabalhada
De divas mãos, brilhante copa, um dia,
Já de aos deuses servir como cansada,
Vinda do Olimpo, a um novo deus servia.
Era o poeta de Teos que a suspendia
Então, e, ora repleta ora esvazada,
A taça amiga aos dedos seus tinia,
Toda de roxas pétalas colmada.
Depois... Mas o lavor da taça admira,
Toca-a, e do ouvido aproximando-a, às bordas
Finas hás de lhe ouvir, canora e doce,
Ignota voz, qual se da antiga lira
Fosse a encantada música das cordas,
Qual se essa voz de Anacreonte fosse.
Atividades
Analise o trecho do poema de Alberto de Oliveira e o pequeno texto de Fernando Cesari Gil.
Aspiração
Ser palmeira! existir num píncaro azulado,
Vendo as nuvens mais perto e as estrelas em bando;
Dar ao sopro do mar o seio perfumado,
Ora os leques abrindo, ora os leques fechando;
Só de meu cimo, só de meu trono, os rumores
Do dia ouvir, nascendo o primeiro arrebol,
E no azul dialogar com o espírito das flores,
Que invisível ascende e vai falar ao sol;
Sentir romper do vale e a meus pés, rumorosa,
Dilatar-se e cantar a alma sonora e quente
Das árvores, que em flor abre a manhã cheirosa,
Dos rios, onde luz todo o esplendor do Oriente;
[...]
Tanto na linguagem poética quanto na retórica acadêmica, poesia e poeta, respectivamente, pairam acima da realidade, constituem-se independentemente e para além dela. São esferas superiores e elevadas, que da realidade guardam apenas a imagem de uma natureza sublimada e transcendentalizada, instância esta a que é reportada a idealidade da figura do poeta e da poesia.
(In: Do encantamento à apostasia: a poesia brasileira de 1880-1919: antologia e estudo. Curitiba: Ed. UFPR, 2006. p. 57)
Embora, e erradamente, o Parnasianismo não seja reconhecido por sua perspectiva de evasão, Alberto de Oliveira trabalhou essa tópica em sua “Aspiração”. Em que sentido a “arte-pela-arte” conduziria o poeta ao isolamento diante da realidade de sua época?
R: A “arte-pela-arte” é o ideal de que a arte independe dos fatores externos, bastando-se por si mesma. Ou seja, o poeta que optasse por essa ideia se sentiria confortável para se abster dos temas e problemas de sua época, evadindo-se de si mesmo (visto que o poeta é um cidadão em uma sociedade) e de seu entorno.
Filme:
O Xangô de Baker Street, assim como o livro homônimo, são ótimas referências culturais para se compreender o período histórico e os próprios poetas parnasianos que são, inclusive, personagens no olhar bem humorado de Jô Soares.
Referências
BILAC, Olavo. Poesias. São Paulo: Martin Claret, 2004.
CORREIA, Raimundo. Melhores poemas de Raimundo Correia. 2. ed. São Paulo: Global Editora, 2001.
GIL, Fernando Cerisara. Do encantamento à apostasia: a poesia brasileira de 1880-1919: antologia e estudo. Curitiba: Ed. UFPR, 2006.
KEATS, John. Ode sobre a melancolia e outros poemas. São Paulo: Ed. Hedra, 2010.
MURICY, José Cândido de Andrade. Panorama do Movimento Simbolista Brasileiro. 3. ed. São Paulo: Perspectiva, 1987.
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