quarta-feira, 10 de julho de 2019

Realismo/Naturalismo - Aula teórica

Realismo, Naturalismo

Contexto sócio-histórico e características literárias


Resultado de imagem para quadro realismoSe o Romantismo é o movimento artístico-filosófico que coloca, no âmbito da cultura e da sociedade, os princípios que emergem com a ascensão da burguesia ao poder, o Realismo e o Naturalismo, por sua vez, já na segunda metade do século XIX, são motivados, sobretudo, pelas contradições, tensões e conflitos sociais gerados a partir da consolidação da burguesia como classe dominante, que encontra na exploração desmedida do proletariado sua forma de enriquecimento. A sociedade europeia de fins do século XIX é caracterizada pelos impactos da liberação das forças produtivas – e, consequentemente, da intensificação da exploração da mão de obra operária –, alcançada,  especialmente, por meio da Revolução Industrial, o que, de algum modo, possibilitou que se tornassem marcas desse período as lutas sociais e a efervescência do debate político, principalmente aquele que se vincula ao socialismo, bem como o progresso científico e os avanços tecnológicos, como, por exemplo, o uso da eletricidade, do aço e o desenvolvimento dos sistemas de comunicação.


Resultado de imagem para courbetO Realismo, como movimento literário surgido na França, o qual encontrou seus impulsos iniciais na publicação de Madame Bovary (1857), de Gustave Flaubert (1821-1880), é uma espécie de literatura que coloca em cena a vida cotidiana burguesa, em sua trivialidade, hipocrisia e desajustes, sem o heroísmo que distingue os protagonistas românticos. Para tanto, o narrador realista assumiria um ponto de vista que se pretende objetivo, neutro e totalizante, frente à matéria narrada. Nesses termos, buscava-se, nos romances, reproduzir a realidade sociocultural com a fidelidade alcançada por uma fotografia, de modo a enfatizar os costumes, as relações sociais e a degradação de determinadas instituições sociais, como, por exemplo, a família ou a Igreja.


O Naturalismo, cujas origens foram igualmente traçadas em território francês, sob a influência de Émile Zola (1840-1902), sobretudo desde a publicação de Thérèse Raquin (1867), é considerado como o movimento literário que intensificou as propostas estético-ideológicas do Realismo, de maneira que, por exemplo, a banalidade da vida humana, no Naturalismo, é representada, sob muitos aspectos, a partir de grupos social e culturalmente marginalizados, por meio da animalidade, crueza, excessos e processos de rebaixamento. Ademais, a ânsia por uma representação da realidade referencial que fosse translúcida motivava que se buscasse na ciência a postura modular a ser assumida pelo escritor, em seu processo criativo.
O movimento naturalista procurou estabelecer forte diálogo com as correntes científicas que estavam em voga no século XIX, principalmente com o Positivismo, criado por Augusto Comte, o qual defende que a única forma verdadeiramente válida de conhecer o mundo é por meio do conhecimento científico, obtido por um método científico coerente; com o Determinismo, de Hippolyte Taine, para
quem o caráter e o comportamento humano são condicionados pelo meio, raça e momento histórico; e com o Evolucionismo, de Charles Darwin, o qual afirma que o meio natural seleciona, entre os seres vivos, as características que permitem uma maior adaptação ao próprio meio e, consequentemente, favoreceria a sobrevivência de determinada espécie.

Resultado de imagem para courbetNo Brasil, os dois escritores de fins do século XIX que poderiam ser classificados como realistas são Machado de Assis (1839-1908) e Raul Pompeia (1863-1895), autor de O Ateneu (1888), porque seus romances elaboram literariamente a realidade sociocultural, de sorte a se resignar – por vezes, até mesmo ironizar – frente às fantasias, idealizações e distorções românticas. Contudo, basta uma rápida leitura de seus romances para observar que o conceito de Realismo apresentado acima não condiz plenamente com a obra desses dois romancistas, sobretudo porque ambos fogem da perspectiva de um narrador que busca se distanciar dos fatos narrados em prol da precisão, plenitude e imparcialidade do que narra e descreve.
Já o Naturalismo brasileiro, embora fosse uma escola literária com curta duração, em nossa literatura, mostrou-se bem diversificado, com romances que representam desde precariedades sociais, no ambiente urbano, como a complicada situação das habitações coletivas – O cortiço (1890), de Aluísio Azevedo (1857-1913) –, passando por problemas sociais que dizem respeito a uma determinada região do país, como as implicações da seca no Nordeste – A fome (1890), de Rodolfo Teófilo
(1863-1932) –, até o estudo do temperamento de personagens femininas entregues às paixões da carne – Dona Guidinha do poço (1892-1952), de Manuel de Oliveira Paiva (1861-1892). Por vezes, o Naturalismo brasileiro se afastou das propostas do Naturalismo europeu, principalmente com a acentuada presença de traços próprios do Romantismo, em alguns romances, como, por exemplo, a permanência da concepção de amor romântico, bem como a construção de personagens com tons heroicos, conforme se pode verificar em algumas passagens de Bom-crioulo (1895), de Adolfo Caminha (1867-1897), romance que trata das relações homoeróticas e inter-raciais em ambiente militar, entre Amaro e Aleixo.

Autores e obras

Machado de Assis

Resultado de imagem para machado de assisPodem-se notar na obra de Machado de Assis, especialmente no romance, dois momentos de sua produção literária: uma fase em que o escritor está mais próximo dos princípios do Romantismo, como, por exemplo, em Ressurreição (1872), A mão e a luva (1874) e Helena (1876), e outra fase na qual o Realismo emerge em primeiro plano, como, a título de exemplificação, em Memórias póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891), e Dom Casmurro (1899), romances que constituem a chamada trilogia realista machadiana.
Machado de Assis entrelaça, em suas narrativas, a investigação psicológica do caráter e do comportamento humano, em sua dimensão mais particular, íntima e subjetiva, com a observação, sempre crítica, dos aspectos sociais, principalmente no que diz respeito à degradação dos valores éticos e morais, através de um cinismo que deixa entrever certa melancolia e, por isso mesmo, encontra na ironia um meio de expressão válido para suas representações, figura de pensamento que Machado, de modo muito refinado, soube explorar com genialidade.
Memórias póstumas de Brás Cubas, seu romance que inaugura o Realismo, como movimento literário, no Brasil, é a autobiografia de Brás Cubas, porém, escrita por ele na condição de “defunto-autor”, isto é, de alguém que, estando morto, começa a escrever suas memórias, das quais podemos destacar seu envolvimento amoroso com Marcela, Eugênia e Virgília, a amizade com o filósofo Quincas Borba, personagem do seu romance homônimo, e o planejamento da invenção do emplasto Brás Cubas, medicamento que curaria todas as doenças. Para além de ser um narrador em primeira pessoa, o que faz com que o narrador esteja implicado na matéria narrativa, o fato de escrever suas memórias após a sua morte, a presença marcante de ironia e os experimentalismos de linguagem, com ênfase na exploração de recursos gráficos, problematizam, nesse romance machadiano, o conceito de Realismo que busca a objetividade na narração.

Aluísio Azevedo

Resultado de imagem para aluísio azevedoAluísio Azevedo, um dos principais escritores do movimento naturalista brasileiro, ainda que apresente certas particularidades, pôde se aproximar das propostas estético-ideológicas do Naturalismo europeu, em especial, da obra do francês Émile Zola e do português Eça de Queirós, o que se observa principalmente em seus romances mais bem realizados, como, por exemplo, O mulato (1881), considerado o primeiro romance aos moldes naturalistas da literatura brasileira, Casa de pensão (1884) e O cortiço (1890), sua obra-prima, em que Aluísio Azevedo se distanciou do melodrama folhetinesco, elemento que, sob muitos aspectos, marca sua produção literária, de maneira
que podemos percebê-lo até mesmo nos dois primeiros romances citados anteriormente.
Em O cortiço, temos o processo de enriquecimento do português João Romão, dono de uma venda,
um cortiço e uma pedreira, o qual não mede esforços para ascender socialmente e equiparar-se aos Miranda, família vizinha de grande riqueza e prestígio. Ao eixo central do romance, que se refere às artimanhas de João Romão para enriquecer, entrelaça-se a narração da vida cotidiana dos moradores do cortiço, de modo a evidenciar literariamente os aspectos instintivos, animalescos e rudes que constituem as vivências desses personagens, como, por exemplo, a sedução da mulata Rita Baiana
sobre o português Jerônimo, que o leva a deixar sua esposa Piedade, também portuguesa, para se relacionar com Rita Baiana, em que o encanto sexual despertado pelo gingado da brasileira se sobrepõe aos compromissos sociais do casamento.

Atividades
Responda o que segue tendo como de partido o quadro abaixo de Courbet.
Resultado de imagem para quadro realismo1- A propósito do ambiente retratado no quadro, responda:

a) Como ele se caracteriza?
b) Trata-se de um ambiente próprio da zona rural ou da zona urbana?Justifique sua resposta com elementos do quadro.
2- Observe as personagens que compõem a cena.
a) Levante hipóteses: Que vínculos pode haver entre elas?
b) Para elas, o que representa o trigo?
3- As primeiras telas de Courbet escandalizaram os salões de arte parisienses,por causa dos temas que abordavam, até então inéditos.
a) Na hierarquia social, que posição ocupavam as personagens retratadas no quadro?
b) Apesar da condição social das personagens, o quadro desperta algum sentimento de piedade ou compaixão nos espectadores?
4- Certa vez perguntaram a Coubert se ele era capaz de pintar um anjo. E ele respondeu: "Jamais poderei pintar um anjo, porque nunca vi nenhum".
a) Qual é o princípio realista presente nessa resposta do pintor?
b) Na sua opinião, o quadro põe em prática esse princípio realista? Justifique sua resposta.
5- Observe as cores em destaque no quadro. Que relação elas tem têm com o tema abordado pelo pintor?
6- Em primeiro plano, destaque-se uma moça.
a) O que sugerem os movimentos dela?
b) Interprete: O que a moça representa nesse quadro?
7- Um dos traços do realismo é a crítica social. Considerando-se o contexto da época, o quadro faz uma crítica à sociedade de então? Justifique sua resposta.


2. (UNICAMP – 2015) Leia o seguinte excerto de Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado
de Assis:
Deixa lá dizer Pascal que o homem é um caniço pensante. Não; é uma errata pensante, isso sim.
Cada estação da vida é uma edição, que corrige a anterior, e que será corrigida também, até a edição
definitiva, que o editor dá de graça aos vermes. (Machado de Assis, Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001, p.120.)
Na passagem citada, a substituição da máxima pascalina de que o homem é um caniço pensante pelo
enunciado “o homem é uma errata pensante” significa
A) a realização da contabilidade dos erros acumulados na vida porque, em última instância, não há
“edição definitiva”.
B) a tomada de consciência do caráter provisório da existência humana, levando à celebração de cada
instante vivido.
C) a tomada de consciência do caráter provisório da existência humana e a percepção de que esta é
passível de correção.
D) a ausência de sentido em “cada estação da vida”, já que a morte espera o homem em sua “edição
definitiva”.
Resposta: C

3. (ENEM – 2011) Abatidos pelo fadinho harmonioso e nostálgico dos desterrados, iam todos, até
mesmo os brasileiros, se concentrando e caindo em tristeza; mas, de repente, do Firmo, romperam
vibrantemente com um chorado baiano. Nada mais que os primeiros acordes da música crioula para
que o sangue de toda aquela gente despertasse logo, como se alguém lhe fustigasse o corpo com urtigas bravas. E seguiram-se outras notas, e outras, cada vez mais ardentes e mais delirantes. Já não eram dois instrumentos que soavam, eram lúbricos gemidos e suspiros soltos em torrente, a correrem eram ais convulsos, chorados em frenesi de amor: música feita de beijos e soluços gostosos; carícia de fera, carícia de doer, fazendo estalar de gozo. AZEVEDO, A. O Cortiço. São Paulo: Ática, 1983 (fragmento).
No romance O cortiço (1890), de Aluízio Azevedo, as personagens são observadas como elementos
coletivos caracterizados por condicionantes de origem social, sexo e etnia. Na passagem transcrita, o
confronto entre brasileiros e portugueses revela prevalência do elemento brasileiro, pois
A) destaca o nome de personagens brasileiras e omite o de personagens portuguesas.
B) exalta a força do cenário natural brasileiro e considera o do português inexpressivo.
C) mostra o poder envolvente da música brasileira, que cala o fado português.
D) destaca o sentimentalismo brasileiro, contrário à tristeza dos portugueses.
E) atribui aos brasileiros uma habilidade maior com instrumentos musicais.
Resposta: C

Sugestões culturais
Filme Poderosa Afrodite, de Woody Allen (1995).
Filme Cidade de Deus, de Fernando Meirelles (2002).
Filme O Cheiro do ralo, de Heitor Dhalia (2007).
Música Cotidiano, de Chico Buarque (1971).
Pintura O violeiro, de Almeida Júnior (1899).
Pintura Indolência e Sensualidade ou Mulheres dormindo, de Gustave Courbet (1866).

Referências
BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. 43. ed. São Paulo: Cultrix, 2006.
COUTINHO, Afrânio. A literatura no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Editorial Sul Americana, 1968. v. 3.
PELLEGRINI, Tânia. Realismo: postura e método. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 42, n. 4, p. 137-155, dez. 2007.
SARAIVA, António José; LOPES, Óscar. História da literatura portuguesa. 11. ed. Porto: Porto Editora, 1955.
SODRÉ, Nelson Werneck Sodré. História da literatura brasileira: seus fundamentos econômicos. 5. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1969.
SODRÉ, Nelson Werneck Sodré. O naturalismo no Brasil. 2. ed. Belo Horizonte: Oficina de Livros, 1992.
VERÍSSIMO, José. História da literatura brasileira: de Bento Teixeira, 1601 a Machado de Assis, 1908. 4. ed. Brasília, DF: Ed. Universidade de Brasília, 1963.

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